segunda-feira, 29 de março de 2010

Brasil começa a discutir um "SUS" para a educação nesta segunda-feira

Começam, nesta segunda-feira (29), os debates para a criação de um "SUS" da educação. Eles fazem parte da Conae (Conferência Nacional de Educação), que ocorre em Brasília, até o dia 1º. Devem participar 2.500 delegados eleitos em municípios e Estados e mais 500 observadores. A Conae vai elaborar o PNE (Plano Nacional de Educação) para a próxima década que será apresentado pelo MEC (MInistério da Educação) ao Congresso Nacional.
A ideia, defendem alguns especialistas, é criar um sistema que integre os governos municipal, estadual e federal -- assim como o SUS (Sistema Único de Saúde). Wagner Santana, oficial de projetos da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) no Brasil é um dos engrossam o coro por uma rede que integre os três níveis de governo.
Coautor do livro “Educação e Federalismo no Brasil: Combater as Desigualdades, Garantir a Diversidade”, Santana concedeu uma entrevista por e-mail sobre o sistema nacional de educação. Ele é enfático sobre o que o país precisa no campo das políticas para o ensino: "É fundamental o estabelecimento de metas realistas e ao mesmo tempo desafiadoras, que sejam monitoradas e avaliadas constantemente e com amplo controle social". Confira parte da entrevista:
UOL Educação - Um Sistema Nacional de Educação deveria ser parecido com o SUS? Em que medida?
Santana - A proposta de Sistema Nacional de Educação atualmente em discussão trata especificamente da construção de diretrizes educacionais comuns a serem implementadas em todo território nacional, respeitando-se as diversidades regionais e tendo como perspectiva a superação das desigualdades regionais. A proposta em discussão atribui também ao Sistema Nacional de Educação um papel de articulador, normatizador e coordenador e, sempre que necessário, financiador dos sistemas de ensino.
Ou seja, não se trata de implementar um “SUS da Educação”, mas de construir estratégias para que a educação brasileira tenha referenciais nacionais de qualidade e que a oferta educativa pelos sistemas de ensino estadual e municipal de todo o país tenha maior identidade. O desenho institucional desse sistema é uma das tarefas a ser enfrentada no processo de elaboração do novo Plano Nacional de Educação.
UOL Educação - O SUS é um modelo elogiado por especialistas, mas, no dia a dia, a população enfrenta problemas que vão da falta de capacidade de atendimento até o mau atendimento. Como um sistema nacional poderia superar estes tipos de dificuldades vistos na saúde?
Santana - A oferta de serviços de saúde e de educação, que são direitos previstos no nosso marco legal, são de natureza muito distinta. Não há nenhum hospital, por exemplo, que tenha que atender o mesmo número de pessoas todos os dias ao longo de quatro, seis ou oito horas. Ao mesmo tempo, o usuário de saúde pode buscar qualquer unidade de atendimento do SUS, enquanto na educação o atendimento quase sempre é feito por uma única unidade.
No caso da educação, a constituição e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação são claros quanto às responsabilidades da União, Estados, Distrito Federal e municípios. Cabe, portanto, estabelecer critérios de gestão da oferta pelos entes federados de forma articulada, colaborativa e normatizada por princípios comuns e tendo como perspectiva a garantia de um direito humano fundamental.
UOL Educação - As desigualdades internas no país são gigantescas. Como um sistema geral poderia dar conta delas? Elas podem ser superadas com financiamento proporcional às necessidades?
Santana - Certamente uma das questões a serem resolvidas é um melhor equilíbrio entre as responsabilidades dos entes federativos quanto à oferta educativa e os recursos disponíveis por cada um deles. Uma reforma fiscal seria a melhor estratégia nesse sentido, mas de difícil viabilidade política no curto prazo.
Assim, estratégias como o Fundef [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério] e posteriormente o Fundeb [O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação] têm cumprido um papel redutor das desigualdades, garantindo patamares mínimos de oferta. Entretanto, ainda persistem desigualdades na disponibilidade de recursos que precisam ser enfrentadas por essas políticas. Outro ponto importante é a necessidade de aumentar o montante global dos recursos a serem investidos em educação.
A proposta de um sistema nacional de educação ou outro modelo de gestão da oferta educativa deve buscar ainda reduzir desigualdades quanto a padrões de atendimento (infra-estrutura de escolas, remuneração e condições de trabalho docente, etc.) e buscar alguma unidade no que diz respeito aos conteúdos ensinados nas escolas, respeitando-se, evidentemente, as diversidades regionais e locais.
UOL Educação - Como fazer com que uma política pública dure além do tempo dos mandatos do executivo no Brasil? Estamos muito longe disso?
Santana - É fundamental que o novo Plano Nacional de Educação seja construído a partir de acordos entre os entes federativos em relação aos principais desafios da educação nacional e as estratégias para enfrentá-los. Além disso, é fundamental o estabelecimento de metas realistas e ao mesmo tempo desafiadoras, que sejam monitoradas e avaliadas constantemente e com amplo controle social. Nesse sentido, é fundamental que o novo Plano defina também instâncias de gestão envolvendo os três entes federados e com participação social. Finalmente, é importante a vigilância junto aos poderes públicos nos três níveis para que o Plano Nacional de Educação, além dos planos estaduais e municipais, sejam a principal referência para a construção de políticas de governo. Essa tarefa está longe de ser simples, mas é condição fundamental para termos políticas duradouras de Estado.
UOL Educação – Quais são os critérios que devemos medir em uma educação de qualidade, além do desempenho e do fluxo de estudantes?
Santana - Quando falamos em qualidade nos referimos a formação inicial e continuada de docentes, a condições de trabalho adequadas e a políticas de valorização dos profissionais de educação, a conteúdos pertinentes e relevantes, a escolas inclusivas e que respeitem a diversidade dos alunos (de gênero, religião, orientações sexuais etc.) entre outros aspectos.



sexta-feira, 26 de março de 2010

A Quinta-feira Santa

A liturgia da Quinta-feira Santa é um convite a aprofundar concretamente no misterio da Paixão de Cristo, já que quem deseja seguí-lo deve sentar-se à sua mesa e, com o máximo recolhimento, ser espectador de tudo o que aconteceu na noite em que iam entregá-lo.
E por outro lado, o mesmo Senhor Jesus nos dá um testemunho idôneo da vocação ao serviço do mundo e da Igreja que temos todos os fiéis quando decide lavar os pés dos seus discípulos.
Neste sentido, o Evangelho de São João apresenta a Jesus 'sabendo que o Pai pôs tudo em suas mãos, que vinha de Deus e a Deus retornava', mas que, ante cada homem, sente tal amor que, igual como fez com os discípulos, se ajoelha e lava os seus pés, como gesto inquietante de uma acolhida inalcansável.
São Paulo completa a representação lembrando a todas as comunidades cristãs o que ele mesmo recebeu: que aquela memorável noite a entrega de Cristo chegou a fazer-se sacramento permanente em um pão e em um vinho que convertem em alimento seu Corpo e seu Sangue para todos os que queiram recordá-lo e esperar sua vinda no final dos tempos, ficando assim instituída a Eucaristía.
A Santa Missa é então a celebração da Ceia do Senhor na qual Jesus, um dia como hoje, na véspera da su paixão, "enquanto ceava com seus discípulos tomou pão..." (Mt 26, 26).
Ele quis que, como em sua última Ceia, seus discípulos se reunissem e se recordassem dEle abençoando o pão e o vinho: "Fazei isto em memória de mim" (Lc 22,19).
Antes de ser entregue, Cristo se entrega como alimento. Entretanto, nesta Ceia, o Senhor Jesus celebra sua morte: o que fez, o fez como anúncio profético e oferecimento antecipado e real da sua morte antes da sua Paixão. Por isso "quando comemos deste pão y bebemos deste cálice, proclamamos a morte do Senhor até que ele volte" (1Cor 11, 26).
Assim podemos afirmar que a Eucaristia é o memorial não tanto da Última Ceia, e sim da Morte de Cristo que é Senhor, e "Senhor da Morte", isto é, o Resuscitado cujo regresso esperamos de acordo com a promessa que Ele mesmo fez ao despedir-se: "Um pouco de tempo e já não me vereis, mais um pouco de tempo ainda e me vereis" (Jo 16, 16).
Como diz o prefácio deste dia: "Cristo verdadeiro e único sacerdote, se ofereceu como vítima de salvação e nos mandou perpetuar esta oferenda em sua comemoração". Porém esta Eucaristia deve ser celebrada com características próprias: como Missa "na Ceia do Senhor".
Nesta Missa, de maneira diferente de todas as demais Eucaristias, não celebramos "diretamente" nem a morte nem a ressurreição de Cristo. Não nos adiantamos à Sexta-feira Santa nem à noite de Páscoa.
Hoje celebramos a alegria de saber que esta morte do Senhor, que não terminou no fracasso mas no êxito, teve um por quê e um para quê: foi uma "entrega", um "dar-se", foi "por algo"ou melhor dizendo, "por alguém" e nada menos que por "nós e por nossa salvação" (Credo). "Ninguém a tira de mim,(Jesus se refere à sua vida) mas eu a dou livremente. Tenho poder de entregá-la e poder de retomá-la." (Jo 10, 18), e hoje nos diz que foi para "remissão dos pecados" (Mt 26, 28c).
Por isso esta Eucaristia deve ser celebrada o mais solenemente possível, porém, nos cantos, na mensagem, nos símbolos, não deve ser nem tão festiva nem tão jubilosamente explosiva como a Noite de Páscoa, noite em que celebramos o desfecho glorioso desta entrega, sem a qual tivesse sido inútil; tivesse sido apenas a entrega de alguém mais que morre pelos pobres e não os liberta. Porém não está repleta da solene e contrita tristeza da Sexta-feira Santa, porque o que nos interessa "sublinhar" neste momento, é que "o Pai entregou o Seu Filho para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna"(Jo 3, 16) e que o Filho entregou-se voluntariamente a nós apesar de que fosse através da morte em uma cruz ignominiosa.
Hoje há alegria e a Igreja rompe a austeridade quaresmal cantando o "glória": é a alegria de quem se sabe amado por Deus; porém ao mesmo tempo é sóbria e dolorida, porque conhecemos o preço que Cristo pagou por nós.
Poderíamos dizer que a alegria é por nós e a dor por Ele. Entretanto predomina o gozo porque no amor nunca podemos falar estritamente de tristeza, porque aquele que dá e se entrega con amor e por amor, o faz com alegria e para dar alegria.
Podemos dizer que hoje celebramos com a liturgia (1a. Leitura) a Páscoa. Porém a da Noite do Êxodo (Ex 12) e não a da chegada à Terra Prometida (Js 5, 10-ss).
Hoje inicia a festa da "crise pascoal", isto é, da luta entre a morte e a vida, já que a vida nunca foi absorvida pela morte mas sim combatida por ela. A noite do sábado de Glória é o canto à vitória porém tingida de sangue, e hoje é o hino à luta, mas de quem vence, porque sua arma é o amor.

Semana Santa. Você sabe o que significa?

A Semana Santa começou a ser celebrada no ano de 325 d.c. através do concílio de Nicéia. Naqula ocasião o Imperador Constantino já havia transformado o Império Romano em um Império Cristão e dái também começou a patrocinar a Semana Santa com a regência do papa Silvestre I.
A escolha dos dias que envolve a semana santa parte da escolha do domingo de Páscoa. O dia de páscoa é escolhido com base nas fases da lua cheia. O primeiro domingo logo após a primeira lua cheia do outono (hemisfério sul) ou da primavera (hemisfério norte) é o domingo de Páscoa. A partir desta data é que são marcados todos os outros dias vinculados a esta festa importante tais como> O carnaval, a quaresma, a quarta-feira de cinzas, o domingo de ramos a sexta-feira santa, a ascenção do Senhor, penstecostes, santíssima trindade e dia de Corpus Christe.
O sentido religioso da Semana Santa é uma reflexão sobre os últimos momentos de Jesus e o porquê da comemoração da Páscoa. A celebração começa no Domingo de Ramos onde é lembrada a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém e termina no Domingo de Páscoa onde comemoramos a sua Ressurreição. Não há Páscoa sem a Semana Santa.

sábado, 20 de março de 2010

Imagem esfacelada

Para qualquer leigo é perceptível que, ao longo do tempo, a imagem do professor tem se transformado e a relação aluno-docente é retratada de diversas formas pelos meios de comunicação. Mas a professora de língua portuguesa dos ensinos fundamental e médio Daniella Barbosa Buttler quis comprovar a teoria a partir de um estudo aprofundado. Em seu doutorado em Linguística Aplicada pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), Daniella desenvolveu a tese A imagem esfacelada do professor - um estudo em textos de revistas e concluiu que a projeção dos professores é tão difusa que inclui questões de gênero, saudosismo e até idealização versus atuais condições para o exercício docente.
"O trabalho teve como proposta refletir acerca da imagem da atividade docente, construída em textos destinados aos professores e ao público em geral, assim como identificar qual discurso algumas revistas difundem sobre e para o professor", explica Daniella.
Dos 400 textos lidos nas revistas, apenas nove crônicas usavam o trabalho do professor como tema, sendo de diferentes autores e épocas, mas todas publicadas sempre em outubro, mês em que se comemora o Dia do Professor.
"Interessante notar que, durante a seleção dos textos, não encontramos crônicas que abordassem o tema de outro profissional. Isso acontece porque a escola e o trabalho docente são muito presentes na vida das pessoas. Todos passaram por um ambiente escolar em alguma época da vida. Por isso os cronistas se sentem à vontade para falar do trabalho do professor", afirma.
Segundo Daniella, as revistas mostraram-se muito voltadas para um modelo romântico do professor ideal. Todos os docentes do passado eram mulheres, remetendo à figura materna. Para a autora, a maioria das crônicas mostra que, por meio do olhar das escritoras das décadas de 30, 40 e 50, pode-se contemplar o que seria a "figura perfeita" do professor em sala de aula. Os profissionais representariam esse professor que consegue dosar, na medida certa, afetividade e competência. Os enunciadores conheceram uma figura "perfeita" e agora buscam perpetuar o modelo romântico de professora ideal que tanto os inspirou.
Um outro conjunto de crônicas mostra que o saudosismo em relação à figura do professor é recorrente. Ela usa como exemplo um discurso da atriz Fernanda Montenegro para o então presidente Fernando Henrique Cardoso, quando homenageada com a Gran-Cruz da Ordem Nacional do Mérito, após receber a Palma de Ouro do Festival de Cannes de melhor atriz pelo filme Central do Brasil. Em um trecho, ela diz: "As primeiras coisas que decorei na minha vida foram dois poemas que Dona Carmosina mandou que decorássemos. [...] Senhor Presidente, precisamos de muitas Carmosinas e, se possível, nenhuma Dora".
Daniella vê na fala indícios desse saudosismo. "Percebe-se que o desejo da atriz é transformar Dora [personagem do filme Central do Brasil] e todas as professoras do presente em Donas Carmosinas porque, segundo ela, as professoras do passado não eram impedidas de agir. A professora do passado mandou e atingiu a eficácia."
Em outro periódico, as crônicas mostram um contraponto: os professores do passado exigiam, portanto eram atores; os do presente se apresentam impotentes para o agir por diversas razões, sendo agentes. "As crônicas têm o debate valorativo entre o aluno do passado e o do presente; o professor do passado e o do presente e as condições de trabalho. O aluno do passado tanto quanto o do presente faz suas reivindicações e também suas recusas. O que há de fato é que, na figura do narrador-aluno que conduz a crônica, temos uma espécie de aluno modelo, que se coloca individualmente. Considero, então, que o que realmente muda é a postura de um aluno no geral, já que ele demonstra muita prepotência e onipotência", explica.
Com relação à mecânica dessas relações no passado, Daniella observou "vozes" de professores que davam ordens e ameaçavam os alunos; de alunos que falavam que o professor não explicava a matéria; pais que pareciam "aterrorizados" com o ponto de vista científico do professor; pais que reclamavam do agir do professor e de outros que incentivavam o seu filho a frequentar a escola. Todavia, todos os conflitos não atingiam o trabalho e a carreira docente.
"Os textos centram-se justamente nessa questão: na construção da representação de uma professora ideal e de seu papel. Apresenta o modelo desse professor, mas não revela os elementos responsáveis para que esse ideal se concretize no processo de ensino-aprendizagem, a não ser o que é da natureza desse professor", afirma Daniella.
Os professores, porém, já não são os mesmos: não existem mais exigências contundentes e muito menos a tentativa de realização dos alunos por meio dos estudos. Nas crônicas fica claro que a aprovação é automática, e o professor é impedido de trabalhar por diferentes razões. Alguns dos indicadores desse mal-estar docente são explicitamente apontados nos textos: a avaliação recorrente dos alunos e pais; o trabalho fora do horário; a preparação; a violência nas instituições escolares; a falta de remuneração adequada.
Daniella avalia que no presente há uma re-configuração negativa. Os verbos estão todos na voz passiva, sem o agente, o que revela que ninguém é responsável pelo tratamento dado ao professor. "O docente é impedido de agir: é impotente, objeto do agir do outro, subordinado à família e aos seus alunos, semelhante ao proletariado. Tem aluno prepotente e onipotente. Todos os conflitos atingem o professor diretamente."
Além disso, a professora diz que é possível perceber, nos enunciados verbais estudados, que a identidade do professor é construída pela mídia na relação língua, imagem, discurso e história, ou seja, a mídia se transforma em suporte de historicidade. Para Daniella, da vida real do professor a mídia mostra apenas o lado negativo. "Assim, o professor passa a fazer parte de uma categoria atacada e responsabilizada pela crise da educação brasileira. O professor é excluído pelo discurso que o desqualifica e o desmoraliza."
Quanto ao título do trabalho, Daniella explica que a imagem de qualquer trabalhador é esfacelada. "Não há uma representação, uma imagem, há várias de um mesmo profissional. Daí a conclusão de que essa imagem é esfacelada pelos múltiplos papéis que o professor desempenha; pelas teorias pedagógicas que mostram a importância do vínculo afetivo com o aluno; a remuneração em descendência; a multiplicação das horas de trabalho; o descontentamento e descrédito da população e das instituições governamentais que culpam os professores; a atividade vista como prestação de serviços; a heterogeneidade na classe dos trabalhadores; o desenvolvimento científico acelerado; o excesso de alunos em sala e a pouca motivação dos alunos", explica.
Opção pelo cotidiano

Em sua tese de doutorado, Daniella Barbosa analisou crônicas publicadas em duas revistas: uma voltada para o público docente e de âmbito nacional e outra distribuída em São Paulo para o público em geral. Na pesquisa foram investigadas as chamadas "re-configurações construídas em textos sobre o trabalho do professor". A autora fez um levantamento sobre as características do agir do professor em situação de trabalho, sobre as quais foram identificadas formas linguístico-discursivas que permitiram detectar essas re-configurações. A crônica foi escolhida por tratar temas do cotidiano e o período de 2000 a 2006 aponta para uma mudança de paradigma do docente, sobretudo porque no início do século XXI ecoavam as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), que tendo sido lançados na última década do século XX orientaram uma profunda mudança na história da educação brasileira.
Os resultados da análise dos textos da revista voltada para o educador foram divididos em duas partes: as crônicas e os roteiros. As crônicas revelaram um saudosismo em relação ao docente do passado. Já os roteiros de reflexão para professores evidenciaram um locutor que se dirige ao "professor", com verbos no imperativo sem camuflar o caráter prescritivo, e tomando como modelo o professor do passado, sem considerar as condições sócio-históricas.
Na análise dos textos da revista de São Paulo a autora encontrou um contraponto e um confronto entre os professores do passado e os da atualidade: os primeiros exigiam e agiam, enquanto os segundos se apresentam como impotentes para o agir, devido à mudança das relações e papéis entre professor, aluno, pais e direção de escola. "Notamos que as crônicas da primeira revista re-configuram o professor como era em um passado longínquo, em que as condições sociais de trabalho eram diferentes, mas mesmo assim a revista coloca esse professor como sendo o professor ideal para os dias de hoje, o que vemos nos roteiros. Já as crônicas da segunda revista mostram como são os professores da atualidade, com seus múltiplos problemas reais, que fazem oscilar o seu papel tradicional."



Adriana Natali




quarta-feira, 3 de março de 2010

Sua majestade, o professor

Num tempo em que a concorrência entre as instituições de ensino superior se acirra, a questão da sobrevivência das organizações coloca-se como preocupação central para muitos gestores. O que faz a diferença nesse contexto? A infra-estrutura, a gestão ou o relacionamento entre alunos, professores e funcionários?
Uma pesquisa realizada pelo sociólogo Gilson Borda, que resultou na sua tese de doutorado, defendida na Universidade de Brasília, contém algumas ideias que podem ajudar as instituições a se posicionarem nesse contexto. A partir de questionários e entrevistas aplicadas a 351 alunos de duas instituições de ensino superior particulares do Distrito Federal, Borda concluiu que um bom professor vale mais do que instalações luxuosas. O resultado é válido para 80% dos estudantes que participaram do estudo e está relacionado, segundo o autor do trabalho, a uma mudança das relações que estão em curso no mundo contemporâneo.
Além de alunos, que responderam a um questionário com questões semi-abertas, foram entrevistados 14 gestores e profissionais das duas instituições. Uma delas existe há mais de 40 anos e localiza-se no Plano Piloto (área central de Brasília); a outra é pequena, nova e fica numa cidade-satélite (periferia). O autor conta que optou por investigar instituições com perfis diferentes para obter mais abrangência de resultados.
"Na segunda metade do século passado prevaleciam o capital econômico e o capital intelectual como valores das organizações. No cenário atual, o capital social está ganhando cada vez mais espaço como fundamento da relação de confiança que uma organização estabelece com as pessoas", diz Borda, explicando que capital social diz respeito às relações das instituições com clientes, prestadores de serviço, funcionários ou a comunidade em geral. Na opinião dele, a importância do capital social só tende a aumentar.
E, nesse processo, os professores desempenham um papel fundamental, afinal, são eles que convivem com os estudantes no dia a dia, constituindo-se na face mais visível da instituição. "O professor consolida ou não a confiança que o aluno mantém com a instituição de ensino", sintetiza o pesquisador. Ele considera que a sobrevivência das instituições está relacionada ao estabelecimento de relações de confiança, sobre as quais se constrói a credibilidade.
Para Borda, esse resultado implica o rompimento de algumas ideias preconcebidas, como a de que a imagem se constrói apenas por meio de uma comunicação eficiente. "A espiral de confiança é construída à medida que são reforçados os valores fundamentais", explica o pesquisador. Ele constatou um grau de satisfação maior dos alunos da instituição mais nova e menor, onde os resultados indicam a existência de maior engajamento dos professores. Por isso, ele reitera que o capital econômico e tudo que se associa a ele (investimento em infraestrutura, por exemplo) está vinculado ao capital social (o bom ou mau relacionamento com alunos, por exemplo). Novamente, os docentes são fundamentais nesse processo: o estudo aponta que a qualificação dos professores é o principal fator de atração de uma instituição .
Para Fábio José Garcia dos Reis, diretor de operações do Centro Unisal, em Lorena, no interior de São Paulo, o reconhecimento da importância do professor numa instituição educacional é algo que se constata ao longo da história e continua valendo até hoje. "Os professores tornam-se referência pelas suas publicações, pelo relacionamento com o mercado, pela sua capacidade de elaborar novos projetos e serviços e pelas diversas conversas com os alunos na orientação para o estudo, pesquisa ou trabalho", afirma.
Para Roberto Lobo Leal e Silva Filho, diretor da consultoria Lobo & Associados, o professor é o "DNA da instituição". "Não adianta ter um salão de mármore se os professores forem omissos", sintetiza. Entretanto, ele considera que o professor tem peso maior ou menor dependendo do perfil da instituição. "Nas instituições de massa, o valor da mensalidade pode ser um forte fator de atração", analisa. Mas mesmo nessas instituições, ressalva o consultor, não se pode esperar a oferta de um ensino de qualidade somente com professores horistas.
Reis se contrapõe, enfatizando que a credibilidade não está relacionada, necessariamente, ao tempo de dedicação do professor, embora reconheça que é importante ter muitos docentes vinculados a fim de se levar adiante projetos de pesquisa, ensino e extensão. "É ideal, mas o alto custo torna isso inviável para muitas instituições privadas."

Titulação é atrativo

Ao realizar a pesquisa para a sua tese de doutorado pela Universidade de Brasília, o sociólogo Gilson Borda pediu, em questionário distribuído aos alunos, que eles enumerassem, de forma classificatória (1º, 2º, 3º lugar), o que mais os atraiu no momento de escolha de uma instituição de ensino superior.
Para 86,6% dos participantes, a qualificação e a titulação dos professores foram marcadas como um dos cinco atrativos mais importantes para a escolha da instituição, distribuídos da seguinte forma: 32,5% dos alunos consideram a qualificação dos professores como o item mais importante; 20,7% como o segundo item; 13,6% como terceiro; 9,3% indicaram como quarto item e 10,5% marcaram como quinto fator. Apenas 1,9% dos participantes enumeraram a qualificação e a titulação dos professores como item menos importante entre os expostos.
Em sua tese, Borda observa que a marca da instituição também é um fator de referência para a credibilidade. "Em um momento inicial, caso o aluno não conheça o professor, ou não tenha informação suficiente sobre ele, é [a instituição educacional] quem pode validar o docente e sua formação", escreve. Em outros casos, especialmente se a instituição está em fase de desenvolvimento de sua imagem institucional, é o professor, pelo seu bom currículo, que gera valor e atratividade para a marca.

País cumpre só 1/3 das metas para a educação

Um dos levantamentos mais abrangentes já realizados sobre a última década, feito sob encomenda para o Ministério da Educação, revela que só 33% das 294 metas do Plano Nacional de Educação, criado por lei em 2001, foram cumpridas, informa a reportagem de Angela Pinho e Larissa Guimarães publicada nesta quarta-feira (3) pela Folha.
O estudo, que abrange o período de 2001 a 2008, aponta ainda alta repetência, baixa taxa de universitários --apesar dos programas criados nos últimos anos-- e acesso à educação infantil longe do proposto.
Criado para implantar políticas educacionais que sobrevivam a trocas de governo, o plano atribui metas a União, Estados e municípios. Muitas delas não têm indicador que permita acompanhar sua execução.
O governo Lula disse que o relatório é preliminar, prometeu dobrar o atendimento de crianças em creches e citou avanços em indicadores dos ensinos fundamental e médio.